RESUMO
As teorias de Piaget
e Vygotsky aplicadas à educação infantil através de recursos lúdicos
Levando
em consideração a expansão da educação infantil, que abrange os cinco primeiros
anos de vida da criança, apresentamos as referências teóricas de Piaget e
Vygotsky relacionadas ao aprendizado e o aproveitamento dessas teorias na
creche e pré-escola. Ainda procuramos abranger a importância das atividades
lúdicas propostas nas metodologias de ensino para a educação infantil, e
constatar as influências dessas atividades e teorias na vida da criança, a
curto e longo prazo.
Palavras
Chave: Educação infantil.Aprendizagem.Escola
1.
INTRODUÇÃO
As mudanças sociais como as conquistas femininas em
relação ao mercado de trabalho e produção refletem nas estruturas familiares e
educacionais. Quando as mulheres eram principalmente “do lar”, viviam para o
cuidado do marido e filhos. A criança neste período começava a frequentar a
escola somente após os seis anos de idade.
Com uma nova organização social comentam Craidy e
Kaercher (2001) sobre o surgimento das creches e pré-escolas, depois das
escolas, associado com o trabalho materno fora do lar, a partir da revolução
industrial, e também a uma nova estrutura familiar.
As mulheres ocupam aproximadamente 70% de participação no
mercado de trabalho de acordo com os dados do IBGE (2010). Aliado a este fato,
seu tempo dedicado exclusivamente ao cuidado do lar, marido e filhos, está reduzido
e precisa ser reorganizado entre a vida profissional, social e familiar.
Surge com essa expansão do mercado de trabalho, a
necessidade da constituição de creches e pré-escolas, como um espaço de cuidado
e educação que permitisse à família continuar sua rotina de trabalho. Para os
pais que não possuem horários flexíveis, a educação infantil é uma grande
aliada.
Para muitas famílias, contudo, a educação infantil é um ambiente
em que a criança apenas brinca, por isso, é importante pensar sobre as
dimensões do aprendizado, a relação entre o brincar e o aprender, e as
transformações que o espaço escolar pode desenvolver na formação do
conhecimento da criança. É importante também responder as perguntas básicas que
deveriam ser feitas por todo pai ou responsável que deixa aos cuidados do
município ou estado a sua criança: O que este lugar de ensino e relações
sociais faz pela criança? O que ele constrói? Como a criança é cuidada e educada
neste ambiente?
Há que considerar que a escola pode oportunizar para a
criança mudanças que os próprios pais não poderiam, levando em consideração a
formação dos profissionais da educação e a profundidade dos estudos teóricos, como
Piaget, Vygotsky, Montessori, Skinner e outros, que compreenderam o universo
infantil e enriqueceram os conceitos sobre os processos de aprendizagem de
maneira a dar-lhe um sentido aprofundado, além de uma práxis intencional onde a
criança não é apenas objeto de estudo, mas a preciosidade para a construção do
futuro.
Há, contudo, coisas que a escola não pode fazer pela
criança, aquilo que é responsabilidade dos pais. Sobre esse aspecto, cabe a
consideração da professora de Psicologia Educacional da Universidade Estadual
de Campinas, Telma Vinha:
Muitas vezes [...] a escola terceiriza problemas
aos pais, e vice-versa, o que gera sentimentos de impotência e sobrecarga em ambos
os lados. Os papéis dos educadores e da família são complementares, porém distintos.
Em casa, há uma relação de autoridade entre os pais e filhos. A criança possui
também uma posição privilegiada e, por mais que se comporte mal, os
relacionamentos se mantêm. Na escola, o cenário muda. O aluno se torna mais um
integrante do grupo, aprende a lidar com novas regras, experimenta conflitos e
percebe que as relações dependem de suas ações. [...] O fracasso da Educação
familiar não pode significar também o insucesso da escola. [...] As crianças
que trazem problemas de casa são as que mais precisam do nosso apoio para se
inserir socialmente (VINHA, 2012, p. 20).
Os papéis da família e da escola devem estar distinguidos
para que as responsabilidades sejam de fato atendidas.
Ficaremos neste espaço escolar, que é nossa área de
pesquisa, experiências e observação, principalmente na educação infantil, para uma
leitura dos métodos mais utilizados para alcançar o aprendizado e o que algumas
atividades lúdicas desenvolvem na construção do saber na infância.
A pesquisa bibliográfica sobre Piaget e Vygotsky traz o fundamento
sobre os processos de aprendizagem relacionados à educação infantil neste
trabalho. Como pesquisa de campo, entrevistamos a professora Francisca Inácia
da Silva, que há nove anos trabalha na educação infantil, primeiramente
pré-escola e atualmente na Creche Municipal Irmãs Carmelitas em Lucas do Rio
Verde/MT. Ela nos apresentou seu plano de aula, e nos falou sobre o desenvolvimento
das atividades lúdicas em sua classe, bem como o objetivo de cada uma.
Selecionamos os principais aspectos bibliográficos dos
referidos autores sobre os processos de aprendizagem em relação à criança até
os cinco anos de idade. As considerações da professora Francisca estão
descritas neste trabalho e também as atividades que ela selecionou de seu plano
de ensino, como exemplos para que pudéssemos compreender melhor a utilização do
lúdico e os objetivos das atividades, observando ainda a presença dos pressupostos
teóricos dos autores nessas atividades.
Depois de coletar as informações, organizar e analisar, tecemos
nossas considerações sobre a importância da educação infantil.
2.
A EDUCAÇÃO INFANTIL
A LDB nº 9394/96 estabelece as
diretrizes gerais para a educação nacional na Seção II, Art.
29, dispõe sobre a educação infantil, como a primeira etapa da educação básica,
com a finalidade do desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade,
em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
ação da família e da comunidade.
Art.
30. A educação infantil será oferecida em: I - creches, ou entidades
equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II - pré-escolas, para
as crianças de quatro a seis anos de idade, embora a obrigatoriedade de matrícula
da criança na escola seja aos seis anos de idade, a partir do ensino
fundamental, é também dever do Estado ofertar creches e pré-escolas de Educação
Infantil.
Cada vez mais o comportamento infantil se tornou objeto
de estudo e observação de diversos pensadores, psicólogos e educadores, levando
em consideração a sua formação e aprendizado refletidos na fase adulta. Os valores
fundamentais para a vida são estabelecidos e organizados nos primeiros anos da
existência humana. A soma desses valores constitui a personalidade e a formação
do pensamento, linguagem e comportamento.
Também a forma como a criança é cuidada, orientada, que
tipo de tratamento recebe, influenciará na sua formação. As crianças recebem
tratamentos diferenciados de acordo com a concepção cultural de valor que lhes
são atribuídas. Por exemplo, nas culturas indígenas, os adultos se abaixam para
conversar com uma criança para que elas não se sintam inferiorizadas.
Imaginemos a diferença que fará na vida de uma criança a forma como ela é
tratada na infância. Quando há valorização da infância, há também uma boa
formação social na vida dessa criança.
Sabemos que o aprendizado é inerente a todo homem. Todas
as pessoas estão constantemente aprendendo, ainda que o façam de maneira
informal. É interessante perceber como os aspectos sociais influenciam também
no aprendizado. Vimos esse processo acontecer de diferentes maneiras, desde uma
memorização enfática até a livre interpretação, não evidenciando um ou outro
método, porque ainda hoje se utilizam essas diferentes formas para levar o
aluno ao ápice do conhecimento.
Como a criança começa a frequentar a escola antes mesmo
de saber falar, significa que muito cedo ela estará envolvida neste processo de
orientação, disciplinas e desenvolvimento do aprendizado. Por isso, falaremos
sobre alguns dos principais processos de aprendizagem sob as perspectivas de
Vygotsky e Piaget e estabelecemos as relações entre a teoria e a prática
pedagógica na educação infantil.
3.
OS PROCESSOS DE APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL
3.1
Aprender Sob a Perspectiva do Desenvolvimento Cognitivo: Piaget
Piaget (1999) considerou o desenvolvimento infantil
através da observação, estudo e organização dos estágios da formação da mente
que segmentados em períodos de desenvolvimento são apresentados da seguinte
forma; 1° o estágio dos reflexos que são as primeiras tendências instintivas;
2° o estágio dos primeiros hábitos motores e primeiras percepções organizadas;
3° o estágio da inteligência prática anterior à linguagem. Estes três primeiros
estágios constituem o período em que a criança ainda é lactente, até
aproximadamente os dois anos.
Os estágios seguintes referem-se à fase em que a criança
já não é lactente, e já está desenvolvendo o pensamento e a linguagem. O 4°
estágio representa a inteligência intuitiva e os sentimentos sociais, principalmente
de submissão ao adulto; O 5° estágio das operações intelectuais concretas, a
lógica, e os sentimentos sociais de cooperação e o 6° estágio das operações
intelectuais abstratas, a formação da personalidade e a inserção na sociedade
dos adultos.
Piaget estuda o desenvolvimento epistemológico da criança
desde os primeiros dias de vida até a adolescência. A compreensão desses
desenvolvimentos possibilita ao profissional da educação o entendimento das
ações do aluno nas determinadas faixas etárias e proporciona uma segurança maior
no seu trabalho.
Segundo Piaget (1984), o desenvolvimento é uma passagem
de um estado de menor equilíbrio para um estado de maior equilíbrio onde as
ideias infantis podem parecer incoerentes e instáveis. Mas na busca pela
equilibração a criança desenvolverá em cada fase as habilidades necessárias
para estabilizar e acomodar a aprendizagem.
Esses estágios são compostos de estruturas originais e
distintas, o que delas é essencial, permanece para o estágio seguinte, como uma
construção. Ele compara o desenvolvimento com a construção de um prédio que continua
a cada tijolo acrescentado, solidificando e formando esse desenvolvimento
mental.
Enquanto a criança está na educação infantil, passa por
duas fases de desenvolvimento segundo Piaget (1999); a) A fase sensório-motor,
do nascimento à aquisição da linguagem (0 a 2 anos), em que ocorre na criança
um extraordinário desenvolvimento mental, esse desenvolvimento não foi
considerado importante durante muito tempo porque não vinha acompanhado da
palavra dificultando o acompanhamento do progresso da inteligência. Mas é um
período em que o universo da criança se desenvolve pela percepção e movimentos.
É, portanto, uma inteligência prática. b) A primeira infância (2 a 7 anos) demonstra
modificações na conduta com o surgimento da linguagem que permite à criança
reconstruir suas ações passadas e antecipar suas ações futuras. Ela também dá
início a socialização pela linguagem e pensamento.
Sob esses aspectos, o papel do educador consiste em
observar em que fase a criança está e colaborar para que esse estágio da
criança seja bem solidificado, a fim de não deixar para a fase seguinte uma
base pouco resistente, que poderá comprometer a formação do processo de
aprendizagem.
A escola sob essa perspectiva serve como meio de
instigação à criança, colocando-a em contato com novas situações e objetos,
para que ela possa desenvolver os processos de assimilação, acomodação e
equilíbrio,
e os jogos cooperam para o desenvolvimento desse processo. Mas, embora a escola
possa colocar a criança em contato com o seu objeto, depende da própria criança
o progresso na aprendizagem.
A questão da organização etária e os processos sistematizados
por Piaget, bem como a “independência” da criança em relação ao seu
aprendizado, é o que pode tornar desinteressante a prática pedagógica e a
função da escola que, em seu papel desacomodado, busca participar ativamente do
processo, por outro lado, é muito útil no conhecimento do desenvolvimento
humano e o sentido das ações em cada fase.
3.2
Aprender: Uma Construção Histórica Cultural de Acordo com Vygotsky
Os processos de Aprendizagem segundo Vygotsky estão relacionados
à formação histórica cultural. A pessoa vai fazendo sua própria história a
partir da interação e transformação do meio em que vive.
Vygotsky (2008) afirma que compreender e comunicar-se são
tarefas comuns às crianças e adultos, mas a forma como cada um desenvolve essas
tarefas é diferente. Desde a fase inicial da infância, a criança começa a
formar conceitos que são amadurecidos e configurados na puberdade.
Neste raciocínio, ele se aplica ao estudo das formações
de conceitos concluindo que: [...] o desenvolvimento dos processos que
finalmente resultam na formação de conceitos começa na fase mais precoce da
infância, mas as funções intelectuais que, numa combinação específica, formam a
base psicológica do processo da formação de conceitos amadurecem, se configuram
e se desenvolvem somente na puberdade” (VYGOTSKY, 2008 p.72).
O processo de formar conceitos acontece melhor na vida do
individuo quando há a participação de outras pessoas que na troca de
informações e ajuda mútua, aperfeiçoa o aprendizado.
Há uma relação entre o aprendizado e o desenvolvimento
que não pode ser analisada separadamente, já que estão relacionados e
combinados de acordo com a teoria de Krofta, em que o desenvolvimento se baseia
em dois processos diferentes, porém relacionados, em que cada um influencia o
outro: a maturação que depende do desenvolvimento do sistema nervoso e o
aprendizado que é em si mesmo um processo de desenvolvimento.
Vygotsky (2007) analisa as teorias de Krofta e Thorndike
sobre o aprendizado. Para Thorndike cada atividade depende de um domínio
específico de habilidades específicas que não significa o desenvolvimento de
outras, ao contrário Krofta propõe que quando alguém aprende a fazer bem alguma
coisa, também fará bem todas as outras coisas.
A grande questão destas discussões é que o aprendizado
começa muito antes da criança frequentar uma instituição de ensino. O que
diferencia o aprendizado pré-escolar do escolar é apenas a sistematização do
ensino. Ao entrar na escola a criança se encontra com conceitos que entram em
contradição com o conhecimento espontâneo que possuía, e a dificuldade de
apropriar-se desses conceitos é muitas vezes vista como erro pela escola, Moço
(2012).
Assim sendo, quando a criança entra na escola, ela
protagonizará os níveis de aprendizado, que segundo Vygotsky são essencialmente
dois: o desenvolvimento real e o potencial.
O desenvolvimento real está relacionado ao que a criança
sabe fazer sozinha, sem pistas, sem ajudas, a partir de seu desenvolvimento
mental. Nesse sentido, observou-se que crianças de mesma faixa etária
apresentavam desenvolvimentos mentais diferentes. Portanto, um sistema funcional de
aprendizado de uma criança pode não ser idêntico ao de uma outra, embora possa
haver semelhanças em certos estágios do desenvolvimento.
O desenvolvimento potencial é o que a criança sabe fazer
com a ajuda de alguém, no caso, o educador.
Entre o que a criança sabe fazer sozinha e o que ela faz
a partir da ajuda de alguém está um espaço denominado zona de desenvolvimento proximal.
Nesta zona de desenvolvimento proximal é que “permite-se delinear o futuro
imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso
não somente ao que já foi atingido através do desenvolvimento, como também
aquilo que está em processo” (VIGOTSKI, 2007, p.98).
Por meio da aprendizagem a criança poderá avançar da zona
de desenvolvimento proximal e despertar seus próprios processos internos para o
desenvolvimento potencial, que ficam mais bem identificados quando a criança
interage com as pessoas em seu ambiente.
Vygotsky (2007) fala da importância que a linguagem
exerce sob a aprendizagem. As crianças pequenas, primeiro fazem um desenho, e
somente depois de vê-lo é que decidem o que ele é. À medida que elas se tornam
mais velhas, adquirem a capacidade prévia de decidir o que vão desenhar.
Primeiro a fala segue a ação e é dominada pela atividade, quando a fala se
desloca para o início da atividade há uma nova relação entre a palavra e a
ação. A fala dirige, determina e domina o curso da ação. A rotina dá a criança
nesse aspecto, a capacidade de planejar sua ação.
Nos dois primeiros anos, a criança reconhece objetos
isolados. Ela está na fase de percepção e associação desses objetos isolados
aos gestos que compensam a dificuldade em comunicar-se através da linguagem. O rumo
de desenvolvimento da criança caracteriza-se pela alteração do comportamento em
cada novo estágio, é um processo dialético que envolve fatores internos e
externos.
Para Vygotsky, um dos
aspectos essenciais do desenvolvimento é a habilidade da criança no controle do
comportamento que se torna possível pelo desenvolvimento de novas formas
psicológicas e o uso dos signos.
A criança expande os
limites do seu entendimento integrando os símbolos em sua consciência. A
linguagem é um meio de reflexão pessoal e social, pois relacionada o indivíduo
e sociedade.
As pesquisas realizadas por Vygotsky são de extrema
importância para a compreensão da individualidade e socialização da criança em
todo trajeto escolar. Através dessa compreensão se percebe as diferenças no
desenvolvimento mental, e pode-se estimular o aprendizado.
Diferente de Piaget que sistematiza e universaliza cada
fase, Vygotsky demonstrou uma flexibilidade maior relacionada ao aprendizado.
Demonstrando através de várias pesquisas, que apesar de semi organizado, ele não
é universalizado, há que considerar o contexto de aprendizagem de cada criança
e sua relação com o ambiente.
Diante desta teoria, o papel do educador é observar o que
o aluno consegue fazer sozinho (seu desenvolvimento real), para intuir qual seu
potencial futuro e estimular o alcance desse potencial.
3.2.1
O lúdico sob a perspectiva de Vygotsky
O brincar tem para a criança uma relevância fundamental
no processo de aprendizagem, pois como aponta Vygotsky (2007), no início da
idade pré-escolar a criança tem desejos que não podem ser satisfeitos, e ela se
envolve num mundo de imaginação e ilusão para satisfazer seus desejos e
realizá-los, esse mundo é chamado de brinquedo.
Durante os anos da pré-escola e da escola as habilidades
conceituais da criança são expandidas através do brinquedo e do uso da
imaginação. Nos seus jogos variados a criança adquire e inventa regras, e nessa
imaginação a criança sempre está acima da sua idade e do seu comportamento
diário quando brinca.
Vygotsky (2007) distingue que para crianças antes dos
três anos de idade, é muito difícil se envolver em uma situação imaginária,
porque ela tem comportamentos determinados e limitados. Mas ela pode
desenvolver relações com os objetos, que ditam o que ela pode fazer, por exemplo,
diante de uma porta, ela desenvolve movimentos de abrir e fechar, na relação
ação com o objeto diante dela.
Como o brinquedo exige ações movidas por regras e
imaginação, só pode ser desenvolvida quando a criança é capaz de separar o
pensamento do objeto, e então ela pode utilizar objetos quaisquer para o
pensamento que têm, por exemplo, quando uma garrafa pet se transforma, em seu
pensamento, em uma boneca. Vygotsky vê o brinquedo como meio de desenvolvimento
cultural da criança.
Os jogos e brincadeiras adquirem um papel importantíssimo,
pois é uma maneira de conhecer o desenvolvimento real da criança e agir na zona
de desenvolvimento proximal para que tenha seu potencial elevado. As brincadeiras
tiram a criança da zona de conforto, trazendo confrontos entre o que ela já
sabia e o que ela poderá saber.
4.
O BRINCAR E APRENDER NA EDUCAÇÃO INFANTIL: DEPOIMENTO DA PROFESSORA FRANCISCA
INÁCIA DA SILVA
4.1
O Brincar e o Aprender
O lúdico utilizado como metodologia de ensino no tempo em
que a criança fica na creche e pré-escola, e os objetivos que cada atividade pretende
alcançar é um desenvolvimento da práxis pedagógica, e alcança dimensões
profundas na vida da criança.
Erikson
(1971) nos fala da brincadeira como uma forma da ritualizar a experiência
pessoal da criança e as relações que a envolvem, em que deixa desenvolver seus
desejos e sonhos e supera as vergonhas, dúvidas, ansiedades e culpas. Então o
brincar ajuda a libertar a criança de emoções reprimidas e aliviá-la dessas
frustrações.
Sob o ponto de vista
desenvolvimentista, Erikson (1987) fala de uma auto-esfera das sensações do
corpo para o brincar; uma microesfera para os brinquedos e uma macroesfera que
se refere aos outros. Na microesfera dos brinquedos a criança transfere para os
brinquedos sentimentos, gestos e atitudes que se referem ao seu corpo, à sua
vida e aos seus sentimentos. Funciona como um objeto de projeção das sensações
que não consegue expressar e dizer. Um alerta é necessário se fazer, quando a
criança não consegue expressar na microesfera dos brinquedos as suas sensações,
podendo regredir para sua auto-esfera, isto é, para seu próprio corpo,
introjetando em mecanismos de defesa as sensações que não conseguiu expressar
na microesfera, como, por exemplo, chupar o dedo, masturbar-se, gagueira e
outros desvios de conduta.
Na macroesfera se conjugam as necessidades de brincar com
as orientações lúdicas para a formação da sua vida. Integram-se os elementos
importantes do desenvolvimento epigenético da criança com sua necessidade de
inserção no mundo dos adultos, onde já se orienta para os elementos formativos
dos valores da esfera social, para cada um dos elementos numinosos dos valores
religiosos, judiciosos dos valores morais, formal dos valores tecnológicos e do
ideológico dos valores de ordem ideológica. Isto pode significar uma passagem
tranquila do brincar para o pensar, do brincar para o trabalhar.
Pois
o poder ritualizador do brincar é a forma infantil da capacidade humana de
lidar com a experiência, ao criar situações-modelo e ao dominar a realidade
através do experimento e do planejamento. É em fases cruciais de seu trabalho
que o adulto também ‘brinca’ com experiências passadas e tarefas antecipadas,
começando com aquela atividade na auto-esfera chamada pensamento (Erikson,
1998, p. 47).
A atividade lúdica é muito mais do que uma atividade de
descontração para a criança, ela é um instrumento de ampla percepção do comportamento
dessa criança, pois o professor tem a partir dessa metodologia como perceber
aspectos psicológicos que a criança desenvolve.
Além dessa iniciação da criança na forma do pensamento e
do trabalho adulto antecipa-se o processo de se fazer do trabalho um ócio, um
exercício agradável e desejado, mutuamente complementar e necessário para a saúde
das pessoas. Assim, o trabalho e o brinquedo não são vistos como mutuamente
separados, o brincar antecipa a forma adulta de enfrentar a realidade e a
superação das contradições da vida pessoal e social anteriormente experimentadas.
O brincar constrói situações modelos para enfrentar seus próprios sentimentos
de frustração ou de ansiedade e antecipa a forma de solucioná-los na vida real.
A cena, o palco, o filme antecipam o desejo de construir o que ainda não se
pode realizar na vida real. Neles também aparecem todos os sintomas da vida
humana não resolvidos das ritualizações numinosas, judiciosas, formais e ideológicas,
bem como das ritualizações não formalizadas em associações e em formas
produtivas e filosóficas.
Todos os temas da idade do brincar, diz Erikson (1998),
dos elementos numinosos transcendentes, das fantasias judiciosas de autonomia e
liberdade, das dramatizações da microesfera e da macroesfera do imaginário
infantil e todo o interior inconsciente se expressam no sonho. A partir da
verbalização pela criança e sua análise podemos conhecer o conteúdo, os
processos e a dinâmica afetiva da criança e educá-la no seu desenvolvimento.
O brincar é um estágio preparatório para que a criança
viva a fase adulta de maneira equilibrada e saudável.
Barbosa e Horn (2001) descrevem a importância da
organização das atividades no cotidiano escolar, possibilitando o envolvimento
das crianças na construção das diferentes dimensões de acordo com suas
necessidades.
Quando a criança está na creche e pré-escola, ela não
está apenas sendo cuidada, mas também educada. O desenvolvimento de atividades
lúdicas nas metodologias de ensino trazem essa dimensão de construção psicológica
e desenvolvimento cognitivo e social.
4.2
Depoimento da Professora Francisca Inácia da Silva Sobre a Utilização dos
Recursos Lúdicos Em Seu Plano de Aula.
A professora Francisca Inácia da
Silva, é pedagoga, especializando-se em Educação Infantil e Especial, trabalha
com Educação Infantil há nove anos, atualmente na Creche Municipal Irmãs
Carmelitas, em Lucas do Rio Verde/MT, e compartilhou conosco sobre algumas
atividades lúdicas que desempenha em seu trabalho e quais objetivos essas
atividades desenvolvem.
Questionamos sobre os aspectos que considera mais
relevantes ao desenvolvimento da criança que frequenta a creche, ao que ela
destacou o aspecto de socialização, que permite à criança conviver com outras
de mesma idade e nessa interação desenvolve valores sociais que são essenciais
à sua formação. Percebe que crianças que frequentam a educação infantil,
desenvolvem melhor sua formação cognitiva e social.
Através de sua experiência, percebe que a escola contribui
para o desenvolvimento social, educacional e psicológico da criança, e quanto
antes ela tiver contato com esse ambiente, melhor será esse desenvolvimento.
Compartilhou conosco a importância
dos recursos lúdicos na educação infantil, principalmente na creche em que a
linguagem e escrita ainda não estão desenvolvidas, e os jogos e brincadeiras
ganham uma dimensão de didática essencial. Sua proposta curricular utiliza os
jogos e brincadeiras de maneira organizada com objetivos a serem desenvolvidos,
buscando desenvolver na criança interação social, coordenação motora,
conhecimento de suas habilidades, etc.
Quando nos permitiu ver algumas
atividades que realizou em classe, percebemos nelas os pressupostos teóricos de
Piaget e Vygotsky, como disposto a seguir:
Atividade
1: Teatrinho (dramatizar a história: Linda rosa juvenil)
Objetivo:
Oportunizar de forma lúdica a ampliação das habilidades
Pressuposto
teórico: Piaget no estágio pré-operatório.
Conteúdo:
Linguagem oral e desenvolvimento da escrita, artes visuais, movimento e
expressão corporal.
Idade:
Pré-escolar
Procedimentos:
Juntamente com as crianças desenhar em uma cartolina o cenário (rosa, relógio,
príncipe, a bruxa, a floresta, e demais integrantes do teatro). Propor às
crianças a dramatização da música:
“A linda rosa juvenil”.
A linda rosa juvenil, juvenil, juvenil
A linda rosa juvenil, juvenil
Vivia alegre em seu lar, em seu lar, em seu lar
Vivia alegre em seu lar, em seu lar
E um dia veio uma bruxa má, muito má, muito má
Um dia veio uma bruxa má, muito má
Que adormeceu a rosa assim, bem assim, bem assim
que adormeceu a rosa assim, bem assim
E o tempo passou a correr, a correr, a correr
E o tempo passou a correr, a correr
E o mato cresceu ao redor, ao redor, ao redor
E o mato cresceu ao redor, ao redor
E um dia veio um belo rei, belo rei, belo rei
E um dia veio um belo rei, belo rei
Que despertou a rosa assim, bem assim, bem assim
que despertou a rosa assim, bem assim
Batemos palmas para o rei, para o rei, para o rei
batemos palmas para o rei, para o rei
Avaliação
da atividade: A participação das crianças nessa atividade traz uma percepção do
comportamento de cada criança.
Recursos:
cd, papeis (cartolina, cartão) cola, tesouras.
Atividade
2: Esconde-esconde na banheira.
Objetivo: Oportunizar momentos de tranquilidade
durante o banho ampliando o vocabulário e trabalhar os seus movimentos
reflexos;
Idade:
Creche (bebês a partir dos seis meses).
Pressuposto
teórico: Piaget, desenvolvimento sensório-motor
e reflexos neurológicos básicos.
Conteúdo:
Linguagem oral e escrita; Ampliação de vocabulário; Movimentos rudimentares;
Reflexos.
Procedimentos:
Numa banheira com o bebê batendo na água com as duas mãos, a educadora que está
sentada ao lado da banheira cuidando de sua segurança, chama pelo nome do bebê
enquanto pega uma toalha de banho e pergunta: você está pronta para brincar de
cadê você? E coloca a toalha na frente do seu rosto para escondê-lo da criança.
Pergunta: “Cadê” você “Vitória”? Não consigo ver você. Cobre seus olhos
novamente e repete a fala. Durante essa atividade, é importante sempre manter o
diálogo com a criança para atingir seu objetivo. Avaliar: Se as crianças participam da atividade oportunizada as elas.
Atividade
3: Afetividade
Objetivo:
Estimular entre as crianças momentos afetividade através de brincadeiras.
Pressuposto
teórico: Vygotsky; Zona proximal
Conteúdo:
Formação pessoal e social
Idade:
Pré-escola
Procedimentos:
Com uma caixa de brinquedos variados proporem a turma que brinque em grupo de
família, amigos, escola. Observar e mediar quando necessário.
Avaliar:
A participação da criança na atividade proposta, os conceitos que a criança
possui dos grupos propostos e como interage.
Atividade
4: Pintura da parede de azulejo
Objetivo:
Estimular exploração de texturas, tocando diversos tipos de superfície.
Pressuposto
teórico: Vygotsky
Conteúdo: Artes visuais, percepção tátil
Idade:
creche e pré-escola
Procedimentos:
Primeiro vamos promover contato como lixa, argila, papel liso, regado cada um
conheça as varias texturas. E logo depois vamos pintar a parede de azulejo com
tinta guache com as mãos para criar expostamente os desenhos, aproveitando a
oportunidade para questionar como é brincar com tinta, lixa, papel rasgado e
outros.
Avaliar:
Como as crianças participaram das atividades propostas. O conhecimento real das
texturas e o desenvolvimento do potencial em relação às mesmas.
Em sua prática docente, a professora Francisca diz que a
teoria de Vygotsky, sócio interacionista é a mais utilizada no processo de
aprendizado onde se possibilita construir o conhecimento a cada momento, e a
ludicidade é uma estratégia insubstituível para essa construção e para alcançar
os objetivos institucionais. Já a relação do lúdico com a teoria de Piaget,
permite especificamente uma observação dos estágios e o contato da criança com
os objetos da atividade, mas a construção do aprendizado nesse pressuposto é
mais uma reação natural da criança do que uma interação social. Por isso,
quando propomos a ludicidade, de Piaget temos os referenciais de comportamento
previsíveis de acordo com a faixa etária, e de Vygotsky temos o desafio de
utilizar essa atividade para fazer com que a criança se potencialize. Piaget
nos aponta referenciais de observação e Vygotsky nos aponta referenciais de
ação para o progresso do aprendizado.
A professora destaca que o lúdico permite ao professor
perceber cada aspecto do comportamento da criança, exige do profissional um
olhar atento e intencional, pois a partir dessa percepção é possível também
estabelecer os planos de ação para que o aprendizado aconteça.
Plano
2012 – Francisca Inácia da Silva.
5.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Consideramos os pressupostos teóricos de Piaget e
Vygotsky como excelentes referenciais para o desenvolvimento da aprendizagem na
educação infantil. Percebemos que essas teorias servem como suporte para o
conhecimento da criança e seu desenvolvimento.
A interação social proposta por Vygotsky, gera conflitos
e construção de saberes que a criança precisa para desenvolver-se mais e
melhor. A escola proporciona isso. O conhecimento cognitivo proposto por Piaget
permite ao educador perceber em que momento a criança está e ajudá-la a
organizar seus reflexos e ações equilibradamente.
Percebemos, contudo, através da experiência da professora
Francisca, que os pressupostos teóricos de Vygotsky, permitem ao professor um
maior campo de ação em relação à criança, e o lúdico nesse aspecto ganha uma
dimensão mais significativa, por promover a interação entre a criança e as outras
crianças, e o professor. Enquanto que os pressupostos teóricos de Piaget são
mais diretivos em relação ao comportamento da criança, pré-determinado para
cada fase, e o professor não tem muito espaço de ação sob esses comportamentos,
porque eles acontecem naturalmente. A atividade lúdica no pressuposto teórico
de Piaget, especialmente permite à criança o contato com novos objetos e ações
estimulando suas atividades motoras e psicológicas, mas estas acontecerão independentes
da ação do professor, porque faz parte da genética da criança.
Quando integrada à escola, a criança está exposta as
relações sociais, e a construção dos primeiros conceitos e forma de aprender.
As atividades lúdicas realizadas neste período ajudam a desenvolver suas ações
e reflexos, ajudam a preparar essa criança para a fase adulta e sua relação com
o trabalho, bem como sua interação com as outras crianças. Dando-lhe uma
percepção maior de mundo e melhorando em longo prazo as relações sociais que
terá.
O aprender de maneira sistematizada e intencional, como
acontece na educação infantil, é de fundamental importância para o
desenvolvimento da criança. Frequentar este ambiente antes mesmo de começar a
falar, é um fato positivo quando levados em consideração que nele a criança
terá a oportunidade de realizar atividades intencionadas para estimular o
desenvolvimento mental, cognitivo e social.
As teorias analisadas são, portanto, de extrema importância
para o conhecimento das ações relacionadas à criança e como acontece o
aprendizado até os cinco anos de idade, a escola deve mesmo se apropriar desses
referenciais teóricos como fonte de pesquisa e observação para embasar as
metodologias, contudo, deve também aprimorar os referenciais ao próprio
contexto, que é diferente em cada tempo e lugar.
REFERÊNCIAS
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para a estimulação das múltiplas inteligências. 17ª Ed. Rio de Janeiro: VOZES, 2011.
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